Nos últimos anos em São Carlos - dos maiores pólos universitários do país- surgiram fortes manifestações, em particular no meio estudantil, voltando a privilegiar uma outra cultura, que não a promulgada pelo grande mercado e mídia. Aliando-se a estas pequenas insurreições, o Festival Arte para Bixo tinha seu primeiro momento em 2010, com apoio de um dos Centros Acadêmicos e do Diretório Central de Estudantes da UFSCar (DCE-UFSCar).
Inseria-se de maneira diferente dentro da universidade, frente a uma necessidade que se denunciava: Era preciso, já desde o primeiro contato do universitário com a universidade, apresentar as ações e motivações destas outras iniciativas, procurando incentivá-lo a se perguntar que é que acontece ao seu redor, permitindo-lhe alternativas.
Em moldes bastante parecidos o Centro Acadêmico Armando de Salles Oliveira (CAASO), assim como outras entidades estudantis, já vinham desenvolvendo este papel em São Carlos, na USP e na UFSCar, como por exemplo com o MACACO (Movimento Artístico e Cultural do CAASO), irrompendo inclusive no mesmo ano com a Macacada. Estas movimentações, de modo geral, tomam corpo no cenário nacional como um todo.
Ações como esta se fizeram e ainda se farão necessárias para dissociar a imagem coletiva que a sociedade tem da universidade. Esta é encarada ora como simples ferramenta para galgar uma posição na sociedade, ora como espaço de maior profusão das festas. As festas universitárias se diferem daquelas da sociedade talvez apenas em grau, já que os valores ali promulgados são os mesmos.
Aquele universo onde o senso crítico é formado, que contestaria aquilo que está dado, que criaria e permitiria uma nova vivência em contato com visões diferentes de sociedade, já não mais é verdadeiro há muito. Um tanto por desapego dos próprios estudantes, mas muito pela própria construção do indivíduo na sociedade, que impele a universidade a servir seus propósitos mais imediatistas.
Neste contexto, a universidade se fecha em si mesma, não atingindo a sociedade onde ela mais seria necessária, deixando-se apenas como máquina replicadora para o mercado. Mesmo os próprios estudantes não conseguem fugir desta nova diretriz. Reflete-se aqui a proibição em diversas universidades pelo país das atividades estudantis, seja pelo seu veto direto, seja pela proibição do consumo e venda de bebidas alcóolicas, tolhendo o que figura invariavelmente uma das grandes atividades agregadoras e o parco financiamento primário dos estudantes. Processos semelhantes aconteceram recentemente na UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas), acabando com uma de suas ações mais tradicionais, o IFCHStock, promovido pelos estudantes do IFCH (Instituto de Filosofia e Ciências Humanas). Na mesma toada segue a USP e em São Carlos este peso já vem sendo sentido, inclusive com a mudança dos rumos diretivos de sua principal entidade estudantil, o CAASO.
Mesmo na UFSCar, dita a excelência no campo da extensão universitária, não se tem uma visão muito diferente. Festivais de palco aberto e ações pelos diversos espaços do Campus não são vistos com bons olhos há muito tempo pela direção da universidade. Seus eventos institucionais ficam presos aos teatros apenas. Uma das poucas iniciativas que perduram é o espaço do DCE-UFSCar, tocado pelos próprios estudantes sem apoio da instituição, ocupado com apresentações e intervenções praticamente todo dia da semana.
Aqui, o Festival Arte para Bixo vem a contramão destas dificuldades, em se tratando de uma ação com respaldo institucional. A Rádio UFSCar, que ampara o Arte para Bixo, já vinha fazendo este papel à comemoração de seus três anos, fazendo a celebração aberta e gratuita nos gramados do Campus. Contudo, mesmo esta abertura para o Arte para Bixo ainda soa como reflexo da visão que se tem da extesão universitária, enquanto mecanismo para alçar visibilidade ao nome da universidade. Nesta edição de 2011 do festival, tinha-se o nome da Pró-Reitoria de Graduação. Assim como o nome do Banco do Brasil, verdadeiro grande patrocinador do evento. Deveriamos ter como grande apoio era a própria instituição, se esta tivesse real interesse em cultivar estes valores.
Todavia, garantia-se estrutura privilegiada a uma ação deste porte, com palco e pavilhão coberto, digno de grande festival, assomado a um line-up fantástico. Conseguia-se um grande festival, apesar de problemas virtuais, como o frio que poderia afugentar a todos e o fim dos estoques do bar de quem não esperava o grande pequeno público, velho e desejoso por este tipo de ação. Mas apesar da boa iniciativa, assim como na Macacada de outrora, o grande público alvo, os ingressantes a universidade, não se tinha. Estes eram tragados ao cotidiano mundano da universidade, onde prepara-se desde o começo o universitário para acompanhar a máquina.
Veja outras fotos da cobertura do festival Arte para Bixo, com Sub Loco e o Fator Acochativo e Mamma Cadela no nosso Picasa.
Um comentário:
Vanderlei, concordo com parte de sua análise mas acredito que ela deva ser expandida para além da música. Mais do que um movimento, é uma movimentação de alguns anos já, que inclui produção e política cultural. Acredito que daria uma boa pesquisa a discussão sobre cultura nos anos 10 em Sanca. É um contexto amplo que implica desde a virada da administração pública (e, consequentemente seus avanços, erros, políticas, Cine São Carlos, Teatro, TVE) até o debate extensionista vindo da UFSCar (Rádio, cineclubismo, arte eletrônica, comunicação, o CONTATO), USP (Macaco, Alternativa FM), com pontos de Cultura como a TEIA e dps o próprio Massa Coletiva e o Circuito Fora do Eixo, Conselho e Fundo de Cultura, outros grupos da cidade, grupos de cultura popular, militantes, enfim, um contexto bem complexo ainda em formação e discussão que mudou o cenário da cidade. Acredito que o Plano Municipal de Cultura vem alavancar este debate agora. Mas com certeza seria um objeto interessantíssimo de pesquisa!
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