The Mars Volta de volta ao Brasil!

Muito diferente da famigerada apresentação no Tim Festival de 2004, que parecia ainda ressoar na cabeça do grupo, fazendo-os evitar voltar ao Brasil, havia um público enorme aguardando a beira do palco Água do SWU Festival já horas antes para a volta aos palcos brasileiros do grupo The Mars Volta.


A imprensa, mesmo a especializada, praticamente ignorou a passagem dos sujeitos pelo país na apresentação única no SWU Festival. O que se dizia mais comumente era que o som era bizarro, estranho ou mesmo entediante, que agradava aos indies junto com Kings of Leon na programação do festival. Algumas poucas passagens, em destaque para a Rolling Stones e o UOL, faziam jus ao show, muito embora ainda não conseguissem se desarraigar da síndrome de apontar a perfomance dos sujeitos, em especial de Cedric Bixler-Zavala e Omar Rodrigues-Lopez, como comparável a Plant ou Morrison. Talvez a comparação seja válida, mas não é ali que se deve apontar a energia do grupo. Ela é simplesmente a evocação mais natural do fulgor que, lamento, outros perderam há muito, plastificados pela indústria.

E ali, no SWU, faziam uma apresentação épica. Não subiam aos palcos com este projeto desde janeiro, com seus pares principais atentos a outros trabalhos, e então, mais do que nunca, o setlist seria imprevisível. À exceção de Cotopaxi, do último álbum de estudio Octahedron, que vinham trazendo sempre como carro-chefe de seu último álbum, e Roullete Dares (The Haunt of), surpreenderam um público clamando por eles já há muito com duas mais do primeiro álbum, De-loused in Comatorium, Cicatriz ESP e Eriatarka, além de Goliath, do quarto álbum, Bedlam in Goliath. Houve ainda uma versão de Broken English, do álbum homônimo da atriz e cantora britânica Marianne Faithfull (que além de extensa discografia e filmografia, tem na biografia uma relação íntima com Mick Jagger e muitas, muitas drogas). Pegava todos de surpresa, deixando a platéia atônita, pensando numa gigantesca jam ao vivo. Mesmo as composições conhecidas tinham vários trechos novos. Mas engana-se quem assim pensa, Omar sempre nos diz, o melhor espaço pra testar coisas novas é ao vivo , e é isso que eles vem fazendo, lançando trechos ainda por trabalhar bem no meio de lances já conhecidos do público. Claro, acabava-se invariavelmente criando uma pancada atrás da outra, com alguns momentos etéreos que serviam para dar fôlego ao público, porque a banda não cansava. Trazer à luz os trabalhos de seu primeiro álbum fazia parecer que o grupo estava debutando novamente no país, justamente considerando o grande espaço entre suas duas apresentações. Bárbaro de todo jeito.

Claro, nos palcos do SWU, todo problemático desde seu nome e proposta até a execução final, era temeroso como o grupo iria entrar. As dificuldades técnicas do SWU eram enormes, com graves falhas conceituais do ponto de vista técnico. Com dois palcos, Ar e Água, trabalhando alternadamente, direcionava-se o sinal do palco com apresentações para os dois. E aqui, a escolha da mixagem do sinal estéreo era terrível. Eles trabalhavam o áudio não para o público à frente do palco específico dos shows "menores", para suas vinte, trinta mil pessoas, mas esperando as cem mil pessoas que surgiam aos shows finais. O exemplo mais claro disso foi quando percebeu-se que no palco Água, onde The Mars Volta se apresentaria, tinha-se centrado (e em apenas um dos lados deste palco) toda a força dos graves dos palcos principais do SWU. Parecia que com tantos shows acontecendo no estado de São Paulo ao mesmo tempo, de SWU, Rush e Bon Jovi, todos ficaram capengas. No SWU, não só a parede sonora criada ali era pequena, mas fez-se uma escolha terrível para a grande abertura dos palcos. Certamente eles teriam capacidade para trabalhar de maneira independente cada palco e ainda assim conseguir uma boa configuração.

E todos os shows daquele dia sentiram isso. De Macaco Bong, que segurava-se bem melhor pela simplicidade do trio no palco, a Mutantes, com vinte instrumentos no palco e ninguém ouvindo nenhum deles com definição, chegava a ser incômoda a sonorização. Contudo, com o Mars Volta, o trabalho feito pelos sujeitos que pareciam surdos à mesa de frente do palco foi sobrepujado provavelmente por um trabalho do sujeito da mesa de lado, que passou incógnito: sentia-se a presença de um baixo ali no Festival como nem o Rage Against the Machine seria capaz, trabalhando graves e subgraves de maneira sublime; Tinha-se a voz de Cedric, em seu timbre icônico e alturas absurdas com todos os efeitos trabalhando em cima, perfeitamente definida entre toda a profusão sonora ali; e tinha-se, raro ver hoje, o uso espetacular da estereofonia nos teclados de Marcel, com passagens de canal a canal arrebatadoras.

O show todo foi capturado para transmissão na íntegra e sem cortes ao vivo pelo MultiShow (com reprise na madrugada da Globo, toda problemática) e já está no YouTube. Então, melhor do que ler a respeito, é vê-lo. E se quiser baixar, tem um link bacana aqui.


COTOPAXI



BROKEN ENGLISH JAM




GOLIATH




ERIATARKA




CICATRIZ ESP




ROULETTE DARES (THE HAUNT OF)



Mas há que se pontuar alguns comentários a respeito do show, sim. Porque, todo mundo sabe, ao vivo é outra coisa. E quando se fala de Mars Volta, é outra coisa mesmo. Infelizmente a apresentação no Brasil (e no restante da turnê alavancada pela América do Sul) não contou com toda a formação. Não estava lá Isaiah Ikey Owens nos teclados, substituído pelo irmão de Omar, Marcel Rodriguez-Lopez, que deixava o grupo sem percussões. Isto de maneira alguma comprometia o show. Da formação clássica, além de Omar nas guitarras e Cedric nos vocais, fazia sua presença Juan Alderete de la Peña com bandeira mexicana e tudo em frente aos gigantescos amplificadores de seu baixo. Na bateria, o contrato mais recente com o bom Dave Elitch.

Infelizmente, The Mars Volta vem ao país apenas em festivais, que não lhe dão espaço suficiente para fazer suas usuais incursões de três horas ininterruptas. O SWU pelo visto tentou mais tempo com os sujeitos ao palco, mas provavelmente Omar, diretor de toda a patifaria, negou erraticamente. Afinal, com uma formação menor vindo para cá, já que Isaiah tinha show na mesma data com sua outra banda, Free Moral Agents, complica-se os arranjos do fino trabalho que é o Mars Volta.

Contudo, vale ressaltar que The Mars Volta não necessariamente é a principal das empreitadas do Omar, pelo menos não do ponto de vista criativo. Quando ele já vem atacando enquanto produtor de um sem número de bandas, como cineasta e afins, The Mars Volta no campo da música é apenas o financiador. Omar lançou, em trabalhos paralelos com diversas parcerias, indo de Frusciante (aquele mesmo que era do Red Hot Chilli Peppers, que ficou fissurado no trabalho deles a ponto de gravar o De-loused in the Comatorium junto com o Flea em estúdio e botar os sujeitos abrindo uma turnê inteira) a Damo Suzuki (aquele mesmo japonês que é uma das vozes mais famosas do krautrock, da época do Can e afins). São mais de vinte trabalhos e a produção deles só vem aumentando, a ponto de terem sido lançados cinco albuns em 2010 até o presente momento, sendo todos eles iguarias raríssimas. Seus trabalhos mais recentes, que vão sob a bandeira Omar Rodriguez-Lopez Group e afins, acompanhado de Marcel nos teclados, Alderete no baixo e o genialíssimo baterista Deantoni Parks, por vezes acompanhado da voz Ximena Sariñana, deusa pop mexicana, e em seu último lançamento, Cizaña de los Amores, de Lisa Papineau, aquela que já cantou para o Air. Divas.

Na realidade, faltam iniciativas no país que peitem trazer trabalhos realmente interessantes de lá de fora, que não o promulgado pela mídia e suas telenovelas. Fato é que The Mars Volta invariavelmente tem um grande apelo junto ao público. Se já não há quem traga The Mars Volta, hoje o lance mais comercial, pop, que alcançou um sem número de fãs, do gênio que é Omar Rodriguez-Lopez, que dirá trazer seus trabalhos outros. E o público quer. Afinal, não era uma só voz que gritava ao final do show no SWU a altos brados "Volta, Volta!"


Setlist The Mars Volta
1. Intro+Cotopaxi; 2. Broken English Jam; 3. Goliath; 4. Eriatarka; 5. Cicatriz ESP; 6. Roulette Dares (The Haunt of);

Vídeos por DandelionVolta.

Foto por In Press.



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