PigSoul


"Rock pesado brasileiro com influências de Mike Patton, John Zorn, Dillinger Escape Plan, Koenji Hyakkei, Sleepytime Gorilla Museum, Estradasphere, Secret Chiefs 3."

Figurava assim o PigSoul no caderno de programação do 10º FEIA, o Festival do Instituto de Artes da UNICAMP, quando apresentaram lá o projeto entitulado Gesellschaftsgründung, do alemão Incorporação. As referências eram assombrosas, do Zeuhl de Yoshida Tatsuya ao  Avant-Prog do Sleepytime Gorilla Museum.

Agora, pela primeira vez em São Carlos se apresentavam em mais uma Noite Fora do Eixo no dia 10 último, no palco do DCE-UFSCar. Noitada organizada pelo Massa Coletiva, onde tocavam ao lado do Thriven e a discotecagem radiofônica do Independência ou Marte. Com uma proposta sem igual, mostravam aqui os ares da graça de seu álbum Chorume da Alma, ou Slury of the Soul, na íntegra, ao vivo, e estavamos lá para ver e viver.


Mas e então, que vem a ser a proposta do PigSoul? Nada mais nada menos que uma manifestação do RIO, o Rock In Oposition, no Brasil. E, raios, que vem a ser o RIO? Trata-se de uma proposta de, muito antes de gênero musical, um movimento, que buscava afirmar certas manifestações pela Europa e América enquanto música, a despeito da crítica da época taxá-los de outra coisa. O RIO carrega um sentimento de indignação, por excelência, uma contraposição à indústria, justamente como o Punk faria com o Rock Progressivo ainda a sua origem, mas implodindo de dentro do próprio Progressivo.

A imagem e semelhança da proposta criada para esta Noite Fora do Eixo, vinha o cartaz de divulgação. Com todas as informações da noite, nomes e símbolos, tatuadas no corpo de um jovem com a alça da blusa por cair e os seios excitados, uns diriam que é mais uma ode à repressão da figura feminina e uma exploração de sua imagem para instigar o consumo em uma sociedade machista. Talvez este seja justamente o retrato preterido inconscientemente e, pior, a interpretação tida pela grande maioria daqueles que a virem. Contudo, uma outra leitura, talvez imediata, talvez mais atenta, pudesse muito bem transpor aquele universo a proposta do PigSoul, do RIO, das Noites Fora do Eixo, do Massa Coletiva: Uma sublevação na música, no Rock, na indústria do entrenimento. E isto se dá pela exploração do sentimento libertário contido ali, quando à própria mulher é permitido este desejo e à sociedade é confrontada com a imagem proibida deste, denunciando-a assim como ao marasmo na música das massas e a exploração desta música e por consequência de seu público pela mídia e grandes corporações.

Enquanto movimento iniciado por meia-dúzia de nomes, havia uma espécie de plataforma política a que se fazer adesão para verdadeiramente ser aceito dentro do RIO: A excelência musical, o comprometimento em desbancar a indústria musical e o comprometimento social com o Rock. Aqui, mais uma vez, o PigSoul se mostra verdadeiro, com seus integrantes esbanjando domínio técnico sobre seus instrumentos, músicos da academia que são, e dotados de expressividade assombrosa; Pisavam por São Carlos numa Noite Fora do Eixo, proposta justamente alternativa a indústria musical convencional, que passa a ter aqui certa raiz comum com o RIO; E, por último, se fazer RIO  no Brasil não for um comprometimento sem tamanho, não sei que é.

Fazer RIO torna-se relativamente mais fácil, claro, quando os membros do PigSoul estão em outros varios projetos, tomando por exemplo o próprio Thriven que tem membros comuns ao PorcoAlma. Um projeto como Thriven é indiscutivelmente mais palatável à grande massa, tanto que ali abria a noite e segurava o clima madrugada adentro deixando a excelência do PigSoul para o final, aumentando a pressão à cabeça do público no negrume cozido daquela terça. Thriven trata-se de uma proposta bem mais rentável, há que se dizer. Assim, parece mesmo que o RIO não sai desta esfera, permanece na sua pura essência, discutindo a música para poucos. Mas seria para poucos de fato?

Mesmo naquela fria noite o famigerado palco do DCE-UFSCar, palquinho como dizem os conhecidos do lugar onde vem se desarolando as Noites Fora do Eixo em São Carlos costumeiramente, estava cheio. Há que se considerar que era a primeira semana de aula ali na Universidade, garantia de bom público, mas é inegável que o formato das Noites Fora do Eixo naquele espaço se consolida bem sucedido, atraindo do amante da música ao boemio eterno. Permanecia ainda, já às duas da manhã o público, curioso por conhecer o extravagante projeto conceitual. Fato é que o bizarro, ápice pós-moderno, está mais mais em voga do que nunca.

E o álbum Chorume da Alma, take único de mais de trinta minutos baixou em São Carlos nos devaneios de Gustavo Boni (baixo, de seis cordas, também da Thriven ), Daniel Rossi "Brita" (guitarra de sete, SETE, cordas e trombone), Rafael Montorfano, (teclado, sintetizador e gritos) e Luis André "Gigante" (mais de duas horas em cima da bateria com a Thriven e o PigSoul) na maior exatidão que a frita complexidade e o capricho que o espaço ao improviso permitiam, executado justamente nos seus pouco mais de trinta minutos. Saindo dali uns impressionados, em transe, outros decepcionados, uns bestificados e outros mesmo indiferentes, desentendidos, fato é que se cumpria um dos papéis maiores que aponta o Rock In Oposition: Chocar.

Iniciativa ímpar no Brasil, já que, se tanto, aproxima-se do RIO o Satanique Samba Trio, o mais brasileiro que o Rock In Opposition poderia ser, propiciaram uma apresentação como a muito não se vê por estas terras, se é que seria possível, de tantas outras investidas. Também, pudera! O show é realmente único, como que intransponível à palavra.

Só que, mais, como se o próprio RIO já não fosse por vezes uma grande e elaborada pilhéria, o PigSoul não se bastava em instigar com o Chorume. Mostrariam uma piada dentro da piada com algumas "musiquinhas" de um novo projeto, chamado Tupinikings of Metal, absurda fábula em que o Deus do Metal joga um raio numa tribo indígena para fazer nascer ali um Deus do Metal brasileiro. Carregada de clichês, a insana brincadeira chega a ser sofisticada, deitando para uma das últimas não-pedidas da noite um Drone safado, chamado Comendo a Própria Mãe, a la Sunn O))). Dar as caras deste jeito depois da profusão sonora que havia sido o Chorume da Alma só fazia jus a proposta como um todo, lembrando os absurdos de outra referência lá, Mike Patton, voz da Ópera ao Grindcore. Restaria saber se eles levam a cabo a alcunha e fazem a dita produção deste novo álbum. Uma apresentação de RIO no Brasil, que dirá, em São Carlos, já era inusitadíssimo. Mas, DRONE?!?


Acontece de o RIO não figurar exatamente um estilo musical, uma vez que centrava-se em torno de uma não-causa. E assim pode-se apontar o PigSoul, a soma descontrolada e ao mesmo tempo precisamente mensurada de elementos, nunca desvelando-se, sempre alheio ao público, a massa.

Mas estes sujeitos do PigSoul não eram de todo desconhecidos afinal. Ao mesmo tempo em que tinham membros comuns na Thriven, o Metalcore que se apresentava antes naquela mesma noite, o PigSoul divide pares com o Eletrogroove, de Campinas, a quem já tinhamos resenhado aqui uma apresentação, na ocasião da 4ª Semana do MACACO, em 2008. Outra proposta instigante, bebendo do Jazz e do Rock, do Punk e do Progressivo, do Afrobeat e do Eletro.

Da mesma maneira nossos sujeitos usam destes elementos apontando para outras vertentes, carregando todas as dualidades, de sentimentos e cores, que se manifestam na sua música em um balaio só. O álbum Chorume da Alma estava disponível, completinho, até uns dias atrás para audição no SoundCloud, plataforma que, vale comentar sempre, é em muito superior ao MySpace para a divulgação de bandas Infelizmente resta apenas um excerto lá, mas há o Last.fm  da banda conta com a versão em um track só do álbum, para download gratuito inclusive!

Muito da sonoridade apresentada em o Chorume da Alma aparenta também ser um trabalho feito pelo próprio prazer e satisfação dos autores, fazendo ali uma música preocupada, carregada das angústias destes. Se quem sabe esta não era a pretensão destes para com o público ouvinte, é o que se passa a eles, havendo identificação. Da mesma maneira que há transgressão, como também o é a excitação dos seios de nossa menina no cartaz.




Mais fotos no nosso Picasa!



4 comentários:

André Rocha disse...

Coisa triste é ficar velho...se eu não fosse um velho teria ficado no palquinho até às 2 da matina pra curtir essa sonzera...mas ter que acordar cedo pra trabalhar é foda...vida longa ao PigSoul! Que eles voltem pra sanca e façam um show com um horário pra velhos como eu...

Anônimo disse...

Teve gravação na radio UFSCAR? Ela vai ficar disponível? Abraço!

montorfano disse...

Caralho. ficamos lisongeados e totalmente contemplados com seu texto, cara. aqui é o chicão, tecladista. Valeu mesmo!!! Pô! E o Tupinikings é verdade mesmo. Mas é uma fábula que será dividida a princípio em 5 EP's de 20 min. vamos gravar o primeiro. [que não tem "comendo a própria mãe", q já é do segundo volume - e eu nunca tinha ligado, mas é muuuuuito a vibe do Sunn))) mesmo].

Vanderlei Reis disse...

Que bom que transpusemos os ensejos da Banda, Montorfano!

E vai ser uma loucura o Tupinikings of Metal, muaheuahe!