Para aumentar ainda mais o leque de opções para o fim-de-semana, o Projeto Música na Cidade traz à São Carlos, mais especificamente no Teatro Florestan Fernandes, na UFSCar, o projeto Axial, listando mais um grande nome em seu histórico. Mesmo sendo um dia onde conflitavam TUSCA e ainda o FUSCA, numa semana em que encerrava-se o V FULEC, não poderíamos deixar escapar a oportunidade de ver a apresentação singular que faz o Axial.
Mas, uma pena, a grande maioria não pensa assim. Devido ao TUSCA, febre anual generalizada que acomete a população sancarlense, o público no Florestan era assustadoramente pequeno. Não sei se a data escolhida foi proposital, para oferecer uma opção um pouco mais cultural para aqueles que decidem não ir aos jogos e festas do torneio, tal qual é a proposta do FUSCA, mas fato é que a escolha reduziu em muito os espectadores. Ainda assim, muito provavelmente a data vinha a coincidir com o encerramento da Semana do Fórum de Debate Diálogos Abertos na América Latina, evento pelo qual o Música na Cidade trazia o Axial. Bom, de qualquer jeito, em um dia com tanta coisa acontecendo na cidade, não deve ter sido algo inesperado para ninguém. O que importa é que os afortunados presentes tiveram a chance de ver um belíssimo show.
Axial, encabeçado por Sandra Ximenez e Felipe Julian, acompanhados de Leonardo Muniz Corrêa e Yvo Ursini, te puxa para um universo sonoro totalmente inusitado, te deixando com a estranha sensação de se conhecer todos os elementos presentes no palco e ao mesmo tempo ouvir algo que nunca se tinha ouvido antes. Este é um exemplo de como se misturar inúmeras influências sem cair na mesmice, e sem ser apenas mistura, mas sim reinventar a forma de fazer música. Para uma mescla feita com tanta maestria, foram cruciais a experiência de Sandra Ximenez ,como uma das fundadoras do grupo A Barca, na área da cultura tradicional brasileira, aliada com o conhecimento de Felipe Julian na composição eletroacústica, adquirida com Flô Menezes e Ignácio de Campos na Escola Panorama de São Paulo. Usado pelos próprios integrantes para de algum modo tentar encaixar o som do Axial, o termo eletro-orgânico parece ser realmente bem apropriado, incorporando à musica diversos sons da natureza, como o coaxar de sapos e folhas secas, de modo a criar uma ambientação bem característica para cada faixa.
E a diversidade não abrange só a música. Imaginei que o show aliaria à música outras formas de arte, como a dança e artes plásticas, mas não foi o que aconteceu. Não de forma explícita, ao menos. Porque, afinal, a própria música tem um aspecto visual. Os sons já conhecidos manipulados pelo computador é quase uma escultura feita com som, trazendo à mente os mais variados tipos de imagens. Um tipo de brincadeira com os sentidos, quase uma experiência sinestésica. Não que uma referência mais evidente às outras artes não fosse bem vinda. E isso apenas falando sobre a sonoridade, porque acima disso tem-se toda uma poesia presente na música, como fragmentos de textos de Guimarães Rosa na música Buriti, e poemas de Stela do Patrocínio na música Espaço Vazio, esta última presente no show, para mencionar apenas alguns exemplos.
Agora, o que não ficou claro para mim é o que seria O Engenho do Desgaste. Seria um próximo álbum, e daí viria as músicas presentes no show que não estão em nenhum dos dois álbuns, como Nanuk e Lelê, ou é o nome do espetáculo? De início, achei que fosse um show para divulgação do novo álbum, mas foram tocadas várias músicas dos álbuns Axial e Senóide, o que me levou a pensar que Engenho do Desgaste fosse o nome do espetáculo, além de que no site oficial está escrito que o próximo projeto teria o nome provisório de SiMBiÓSE. Se alguém souber, gostaria muito de uma resposta! Bom, mas falando sobre o repertório, como dito pela própria Sandra Ximenez, o setlist foi cuidadosamente montado para a ocasião do Projeto Fórum de Debates, que trata de diversos temas da América Latina, ocorrido na UFSCar de 21 à 26 de setembro, da qual o show fazia parte. Aí era justificado a presença de músicas como Papaloko, uma canção de escravos do Haiti, e Arenosa, música de Gustavo Leguizamón, da Argentina.
Com influências culturais de tantos lugares diferentes como o Haiti, Argentina e principalmente a África, às vezes penso que rotular Axial como música brasileira tão-somente, como se vê as tantas por aí, é limitar um projeto tão abrangente, muito embora também apresente vários elementos genuinamente brasileiros, como o coco da Paraíba, orikis do candomblé da Bahia e baião das princesas do Maranhão. Bom, independente de rotulações, só ouvindo mesmo para se ter uma idéia do que é, e então cada um classifica do modo como achar melhor.
O setlist completo do show foi o seguinte:
01. Padê Onã; 02. Cantiga de Amigo; 03. Filha da Palavra; 04. Papaloko; 05. Espaço Vazio; 06. Beijo da Iara; 07. Lelê; 08. Arenosa; 09. Eu Danço; 10. Peregum; 11. Nanuk; 12. Iemanjá (BIS)
Mais fotos desta noite também podem ser vistas no nosso Picasa!
Fotos: Vincent de Almeida
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