Cobertura: Braia e Tuatha de Dannan no Centro Cultural São Paulo



Domingo, 12 de Julho, e lá estava eu para mais um dos shows do Tuatha de Dannan no Centro Cultural São Paulo, na (ainda) Estação Vergueiro. Havia perdido o do dia anterior, o que só me deixava mais ansiosa ainda. Entendam, eu já devo ter ido à cerca de dez shows deles e, excetuando o show com Martin Walkyier, ex-vocalista e criador do Skyclad, que ocorreu no Manifesto, os melhores shows que já vi deles em São Paulo ocorreram no Centro Cultural... E funciona. Lá você pode escolher se quer assistir bem de cima, sentado na altura da banda, ou pulando e dançando em frente à mesma. O planejamento sonoro geralmente é bem melhor que o dos bares ou mesmo casas de shows, e tem o tamanho ideal para você não morrer claustrofóbico e ainda assim se sentir num ambiente único e intimista com a banda. Por isso foi impressionante quando, chegando ligeiramente atrasada, fui surpreendida por um público todo sentado e comportado, como se ouvindo uma história mágica e surpreendente. O motivo de tal quietude é que não, não era um show habitual do Tuatha. Ao menos não inicialmente.

Naquela noite quem tocava primeiro era o Braia, projeto solo do vocalista Bruno Maia que se propõe a mesclar a MPB mineira, música celta e Rock Progressivo. Produzido com a colaboração de vários músicos, para essa apresentação contava com o referido Bruno Maia nos vocais, flautas, guitarra, bouzuki, banjo e trocentos outros instrumentos, Fernanda Ohara e Isabel Tavares nos vocais, Rafael Castro e Edgard Brito nos teclados, Alex Navar na gaita de fole, Roger Vaz no violino, Giovani Gomes no baixo, Anderson Alarça na bateria e Julio Andrade nos violões e bouzuki.

Abrindo o show e justificando todo aquele clima quieto da platéia, um solo de gaita de fole de Alex Navarro, emendado na música de introdução ao álbum e ao projeto, Slainte a la Brasilis, na qual a banda improvisa ritmos brasileiros com instrumentos celtas. E logo aí percebemos qual o ideal do grupo: mesclar culturas e influências, referências e personalidades.

O show segue com faixas de seu trabalho de estréia ...e o mundo de lá. Com destaque para Dança do Abismo, na qual o vocal lírico e suave de Fernanda se contrapõe à voz forte e precisa de Isabel, criando um diálogo que lembra muito aquele tom bardo e teatral de se contar uma história. O mesmo comentário pode ser feito para a Falalafada, em que Isabel vai aumentando a tensão da música até um ápice, em que Bruno Maia entra contrapondo a ela. Ambas apostam num clima mais pesado, dramático, mas, ainda assim, sem perder a suavidade. Essa é uma das coisas que me agrada muito no Braia, essa naturalidade com que as músicas pulam do épico das grandes lendas celtas para o tom dançante, presente, por exemplo, em Brunebriante Papuloa Dançante, Juras Promessas ou Tempos Idos, outros dois pontos altos da noite.



Para os puristas de plantão, não, de fato não é música celta tradicional. E em momento algum se propõe a ser. É um projeto claramente pessoal, com diversas influências e que busca aproveitar ao máximo cada colaboração musical, ilustrada muito bem pelos solos de Fernanda Ohara, Alex Navar, Anderson Alarça e Roger Vaz. Ou na que ia encerrar o show do Braia: Pinga do Duende Maluco, uma daquelas composições raras, cheia de mudanças de tempo, um ótimo aproveitamento dos mais variados timbres dos instrumentos e vozes, a música mais irreverente do grupo, que já ia levantando o público e tornando-o mais ativo para o que seria o show do Tuatha.

Porque se a sonoridade ao vivo do Braia evoca um público mais contemplativo, que observa as portas para um mundo mágico serem abertas e as lendas saírem lá de dentro, a do Tuatha te pega pelas mãos e te leva pra dentro desse mundo. É incrível que por mais shows deles que você tenha ido, eles nunca decepcionam, nunca. Uma daquelas bandas cuja apresentação ao vivo não só alcança a performance de estúdio como a supera sempre! Presença de palco, noção de performance que sobra à banda, que contagia o público.

Após um intervalo imperceptível, entram novamente no palco Bruno, Giovani, Edgard e Roger Vaz, com Rodrigo Berne assumindo o violão e Julio Andrade se posicionando na bateria. Este, mais que roadie oficial da banda, nesse show particularmente mostrou sua integração com a mesma, substituindo o baterista oficial Rodrigo Abreu prontamente e segurando a bateria em todas as músicas com uma qualidade e familiaridade que surpreendeu até os companheiros de banda.

Abrindo com a já tradicional e sempre aclamada pelo público Tan Pinga Ra Tan, uma música de boas vindas que tira a apatia de qualquer pessoa que ainda se permitia a ela. Seguem com Land of Youth (Tir Nan Og) uma das mais, senão A mais dançante música deles, e que, junto com a que se segue, capta melhor o estilo do último álbum Trova de Danu. Mais rápidas e animadas Believe it's True engata um medley com Behold The Horned King e The Dwarves Rebellion.



Um show de clássicos, o descanso ao clima dançante viria nas mais lentas Last Words e Us, ambas do debut da banda, duas das mais bonitas composições do grupo, que abusam dos arranjos de flauta e bandolim, se é que isso pode ser dito a respeito de alguma música deles sem correr o risco de ser injusto com todas as outras.

E aqui cabe um adendo para evidenciar a integração da banda. Poucas bandas têm a capacidade de improvisação e sintonia como eles têm. Claramente um show menos “planejado”, sem que isso seja visto como um ponto negativo, a banda improvisava em cima de arranjos das músicas com aquela clara segurança de quem as conhece tão bem que sabe exatamente os pontos onde se pode redirecionar um tema, adicionar um solo, uma mudança. Percebe-se que já desenvolveram um clima a ser criado a cada apresentação de maneira que conseguem agrupar as músicas numa ordem que sempre parece ser a melhor para o momento, sem jamais quebrar o encanto ou deixar o público baixar com algum momento tedioso. Mesmo durante as pausas entre músicas, a conversa constante com o público e as brincadeiras de algum dos músicos fazem parte do show, do hiato de tempo/espaço criado durante as apresentações, que esperamos que se repitam em breve e tenham seus climas transpostos para os DVDs que estão por sair.

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